“Os militares oferecem uma imagem perfeita de como os fascistas vêem o mundo.” (Christian Caryl – [1])
“…são os críticos da esquerda radical, que odeiam os liberais e conservadores, quem mais se assemelha ao fascismo. São nacionalistas… “ (Rodrigo Constantino [2])
Como é que é? Eu li isso aí direitinho? Será? Terá sido, mesmo, escrito isso aí?
Que é isso, caramba? Onde estamos? Os críticos de esquerda são nacionalistas? Desde quando? A esquerda radical é nacionalista? Desde quando? Todo nacionalista será um fascista “porque” é um nacionalista? Liberais todos e conservadores todos serão essencialmente democratas, e nem um liberal nem um conservador será nacionalista “porque” ser nacionalista é ser fascista e ser fascista é coisa de gente de esquerda? Quem seria e que seria um internacionalista? Um internacionalista não poderá ser de esquerda? O interesse internacional, “porque” não é o interesse nacional, portanto, “porque” não é fascista, nunca manifestará qualquer proximidade com qualquer governo totalitário e nunca o beneficiará? “Porque” as ONGs e as igrejas não são nacionais, mas são ou pretendem ser supranacionais, serão essencialmente democratas os que delas participam? Nenhum de seus representantes teria, jamais, apoiado os fascistas ou apoiado a esquerda ou aos que os apoiam ter-se-ia misturado? Se os sindicatos, os clubes e a imprensa subordinam-se ao governo isso acontece “porque” o Estado poderá ser entendido como “a manifestação lógica da vontade de uma nação de afirmar e defender seus direitos coletivos”? São nacionalistas os que pretendem a “unidade latino-americana”? São nacionalistas os que nos submetem a pressões “filosóficas” internacionais e desprezam a nossa boa Doutrina jurídica, deturpando a natureza da Constituição e a finalidade de nossas Leis e nossos Códigos? Todo e qualquer Estado nacional seria fascista? Por quê? “Porque” alguém disse que é, então passou a ser? Então, o Estado nacional é fascista “porque” é? E todo aquele que defenda o seu Estado será um fascista? Por quê? “Porque” é? E, então, militares, porque são militares, e porque defendem o Estado, serão fascistas? Por quê? “Porque” são?
Caramba! Que confusão dos infernos! A produzir mais confusão… e mais calor dispersivo!
Nenhum erro consertará outro erro. Assim como nenhum erro justificará ou “legitimará” que se cometa outro erro qualquer. Assim sendo, e sendo a discussão a respeito de “Filosofia Política”. não por acaso, de repente, eu me lembrei de Rousseau. Seria Rousseau um fascista? Prestemos atenção, porque a leitura do texto abaixo pode ser interessante – não é suficiente, mas ajuda um bocado a pensar:
“… cada indivíduo pode, como homem, ter uma vontade particular contrária ou dessemelhante à vontade geral que possui na qualidade de cidadão. O interesse particular pode falar-lhe de maneira totalmente diversa da que lhe fala o interesse comum (…) sua existência absoluta, e naturalmente independente, pode fazê-lo encarar o que deve à causa comum como uma contribuição gratuita, cuja perda será menos prejudicial aos outros que o pagamento oneroso para si (…) O caso da dissolução do Estado pode-se dar de duas maneiras: primeiramente, quando o príncipe não mais o administra conforme as leis, e usurpa o poder soberano. Então, acontece uma mudança considerável: é que, não mais o governo, mas o Estado se restringe. Quero dizer que o grande Estado se dissolve, e que se forma um outro no seio daquele, apenas composto dos membros do governo, e que nada mais é em relação ao resto do povo senão o senhor e o tirano. (…) O mesmo sucede também quando os membros do governo usurpam separadamente o poder, que só devem exercer em conjunto, e que não constitui menor infração das leis, e produz ainda maior desordem. Têm-se então, por assim dizer, tantos príncipes quantos magistrados, e o Estado, não menos dividido que o governo, perece ou muda de forma. Quando o Estado se dissolve, seja qual for o abuso do governo, toma o nome de anarquia.” –
Por preguiça, para não traduzir o que já foi traduzido, colei esse texto de uma publicação na web. Até mesmo a leitura de um texto publicado deve ser atenta, pois ao ser traduzido poderá confundir o leitor. Aqui eu precisei, com recurso ao original francês, corrigir o texto acima. Mas deu pra entender o “tamanho” do que está dito nele? Não foi retirado de uma página de qualquer manual de “psicologia” de quintal – ele está em “O Contrato Social”, leitura básica, fundamental, obrigatória para quem quer se aventurar a pensar a Política, ou seja, a quem queira pensar no Poder com alguma seriedade e o mínimo risco de errar e se esborrachar. Evitando assim, correr o risco de fazer que muitos outros se esborrachem.
Estado não é, definitivamente, um palavrão. Trazendo as coisas aos nossos dias, o Estado contemporâneo, que garante o cidadão, que garante as liberdades e os demais direitos do cidadão, que o cidadão tem o dever de garantir, ou seja, de conservar vivo e atuante, é um Estado nacional. Estado seria governo? Seria um Partido? Seriam “as massas” desorientadas? Se estivermos contra um governo, contra um Partido que tenha posto o Poder no bolso, contra a ação de “as massas” desorientadas, necessariamente estaremos contra o Estado ou deveríamos estar contra ele?
Que mais, além do Estado, justificará ou “legitimará” um governo? Que poderes terá qualquer governo senão aqueles que lhe são conferidos pelo Estado? Os que um Partido lhe confere? Os que “as massas” desorganizadas lhe conferem para que tudo mais se desorganize e ninguém mais conte com direitos porque ninguém mais se reconhece como estando “legitimamente” sujeito a deveres? O Estado é o Estado. Deve servir a ele mesmo, a ninguém mais. E ao Estado, a ninguém mais, deverá um governo servir. Ou seja: quando o Estado é nacional, quando é nacional o governo, ambos deverão servir a uma Sociedade Nacional que esteja politicamente organizada com vistas ao interesse nacional. E o interesse do Estado deve ser colocado pelos cidadãos acima dos interesses particulares, sim, por todos eles, sim, inclusive por aqueles que exercem profissões liberais, sim, acima de seus interesses particulares, sim! Ou o dito Estado não será um Estado, será outra coisa qualquer. Pode ser uma “ação entre amigos”. E o dito cidadão não será cidadão algum – será apenas um indivíduo, um sujeito de 2ª categoria, a se arrastar, desarraigado, pelo mundo afora, eternamente condenado a pedir desculpas por existir e a pedir licença para nesse mundo entrar espremendo-se por uma brechinha que os donos das bancas no Mercado se esqueceram de tapar.
Quem leu muita coisa poderá saber de alguma coisa. Mas ficará sem saber de um monte de outras coisas se não tiver lido os clássicos, ou se apenas abriu os livros para poder dizer que leu, se leu por ler, sem prestar atenção ao que já foi pensado e já nos foi dito por quem pôde observar como as coisas se fazem. Achará que tudo é novidade, que toda suposta novidade terá apoio na História e deverá ser considerada e divulgada tal como foi inventada e enunciada como novidade por não sabemos quem, e confundirá facilmente governo com Estado e os alhos com os bugalhos. Para quê? Por quê? No interesse de quem? A quem interessa que a anarquia (de esquerda? de direita? que importa?) se imponha em território brasileiro? A quem interessa que o Brasil seja governado por quem brasileiro não é, por quem não se preocupa com os brasileiros, embora possa jurar de pés juntos que muito se preocupa com a tal da “Humanidade” e não com apenas rechear seu próprio bolso ou com o sucesso dos negócios do seleto grupo com o qual se identifica?
Divulgar notícias e comentários sobre os fatos, comentar os fatos, posicionar-se com relação a eles é uma coisa. É fazer Política. Não é apenas um direito – é um dever do cidadão. Divulgar considerações pretensamente “filosóficas” de qualquer um como sendo “a verdade” política é bem outra – é só tentar fazer confusão, ou aumentar a confusão! É errar. É tentar justificar erros. E justificar um erro será apenas insistir nesse erro e dar mais poderes aos que erram.
Não por acaso, também, portanto, eu ouvi, ontem, sendo várias vezes repetido no Painel da GloboNews, que “a Economia lida com os fatos e Política lida com a interpretação dos fatos”… Se as palavras não foram exatamente estas, o sentido delas era exatamente este. Já não seria mais que hora da Política brasileira começar a lidar com os fatos, deixando as “interpretações” de lado?
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http://oglobo.globo.com/pais/moreno/posts/2014/03/20/quando-chamar-alguem-de-fascista-528253.asp
Quando chamar alguém de fascista – CHRISTIAN CARYL
Palavras são armas. E, quando você mira num inimigo político, a palavra “fascista” equivale a um obus. Na era pós-Auschwitz, acusar alguém de “fascista” é uma das mais devastadoras acusações.
Raramente a palavra experimentou um retorno como o que vemos hoje. O maior acelerador hoje é a crise na Ucrânia. Vladimir Putin e a mídia estatal russa adoram descrever os revolucionários em Kiev como “fascistas” (termo firmemente rejeitado pelos defensores dos protestos que derrubaram o presidente Viktor Yanukovich). O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, usa “fascistas” para os manifestantes que têm saído às ruas para pedir sua demissão. (Madonna respondeu aplicando a mesma palavra a Maduro.) Turcos de esquerda que se manifestam contra o premier Recep Erdogan denunciam seu “fascismo”.
Na Ásia, comparar países com a Alemanha nazista tornou-se um jogo de salão. Os norte-coreanos chamam o premier japonês, Shinzo Abe, de “Hitler asiático”. Os chineses acusam Abe de “venerar nazistas orientais” por suas visitas a um controvertido santuário da Segunda Guerra Mundial. Hillary Clinton não empregou a palavra para Putin, mas comparou a ocupação da Crimeia à tomada dos Sudetos por Hitler.
Quando as pessoas usam uma palavra tão carregada com tal facilidade é tempo de um choque de realidade. Há consenso entre historiadores e cientistas políticos sobre como defini-la.
1. Começa com a quimera da pureza racial.
Historicamente, o fascismo nasceu das ansiedades do fim do século XIX, quando radicais de direita em países europeus começaram a se ver como parte de “nações” orgânicas, que enfrentavam ameaças existenciais diante das poderosas novas ideologias do socialismo e do capitalismo. Para eles, teorias abstrusas pareciam confirmar a ideia de que minorias “inferiores” (judeus, eslavos) conspiravam para atacá-los. O colapso das monarquias dominantes e do sistema tradicional de valores na Primeira Guerra Mundial abriu um vácuo que os fascistas correram a preencher.
E no mundo de hoje? Há muitos racialistas xenófobos por aí. Mas apenas o racismo não faz de você um fascista.
2. O Estado reina supremo.
“Tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado.” A frase é de Benito Mussolini, uma das primeiras pessoas a falar com aprovação de “totalitarismo”. Fascistas acreditam no Estado porque o veem como a manifestação lógica da vontade de uma nação de afirmar e defender seus direitos coletivos. Assim, sindicatos, clubes e a imprensa deveriam ser subordinados ao governo. Noções como “direitos humanos” nada significam fora da moldura da “comunidade popular”. Os fascistas têm pouco em comum com, por exemplo, supremacistas brancos americanos, profundamente desconfiados de qualquer tipo de governo. Fascistas e anarquistas ocupam lados opostos do espectro político.
3. Um único homem forte dá as ordens.
Foi o fascismo que nos deu a noção de um líder todo-poderoso, carismático — o Duce ou o Führer — que pessoalmente encarna os anseios da nação. (O comunismo também tinha seu Grande Timoneiro e seus Jardineiros da Felicidade, mas mesmo esses personagens sobre-humanos ainda estavam supostamente seguindo os ensinamentos de um certo filósofo judeu alemão.) Muitos autocratas pós-1945 — vem à mente o argentino Juan Perón — aprenderam com esses modelos.
É digno de nota que os movimentos de protesto na Ucrânia ou na Venezuela não lutam para instalar um líder em particular. Eles querem democracia — o oposto do poder de um só homem.
4. Fascistas põem os militares acima de todos.
Os fascistas celebram as massas — mas apenas quando elas são rigidamente organizadas em torno das necessidades do Estado. Os militares oferecem uma imagem perfeita de como os fascistas veem o mundo. Visitantes à Alemanha nazista notavam a pletora de uniformes: para os não iniciados, era difícil diferenciar motoristas de ônibus e outros funcionários de membros das forças armadas. E política externa agressiva, expansionista, tem sido marca registrada de muitos regimes fascistas, embora não todos. A Espanha de Franco e Portugal de Salazar são talvez os melhores exemplos de regimes fascistas clássicos que preferiam manter um perfil discreto.
5. Fascistas zombam da racionalidade.
As raízes do fascismo clássico estão no período romântico — uma estirpe aparente na ênfase fascista na emoção, na vontade e na unidade orgânica e sua rejeição aos valores do Iluminismo —, no individualismo e no pensamento crítico. A ligação pode ser feita com os “decadentes” do fim do século XIX, como o poeta italiano Gabriele d’Annunzio, que celebrava a morte, a violência e a destruição dos “valores burgueses”. Os fascistas sempre veem a nação como ameaçada e sua tomada do poder é retratada como um renascimento nacional que varrerá a decadência e a fraqueza.
6. Partidos fascistas se veem como “terceira via”.
Hitler e Mussolini viam suas versões do “nacional-socialismo” como a única alternativa válida a todas as outras ideologias políticas. Rejeitavam violentamente o socialismo e o “capitalismo burguês”, enquanto diziam se apropriar das melhores características de cada um. Por exemplo, absorveram ideias marxistas de revolução e uma abrangente engenharia social, deixando de lado a divisiva luta de classes. Também tentavam preservar os aspectos competitivos do capitalismo (o que, para eles, assegurava a “sobrevivência dos mais aptos”), enquanto afirmavam o controle estatal sobre setores estratégicos da economia. É verdade que alguns fascistas tentavam incorporar a Igreja Católica em seu sistema ideológico. Mas Hitler, um zeloso anticlerical, sonhava com o dia em que as massas pendurariam o Papa pelos calcanhares na Praça de São Pedro.
Publicado no Globo de hoje. Christian Caryl, pesquisador no Legatum Institute, é editor do Laboratório de Democracia da revista “Foreign Policy”, para a qual escreveu este artigo.
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http://veja.abril.com.br/blog/rodrigo-constantino/sem-categoria/o-uso-indiscriminado-do-termo-fascista/
20/03/2014 às 12:15 \ Fascismo, Filosofia política, Sem categoria
O uso indiscriminado do termo “fascista” – RODRIGO CONSTANTINO
Todo liberal e conservador está acostumado: quando o oponente marxista fica sem argumentos, o que ocorre sempre, ele puxa da cartola a acusação fulminante: fascista! A esquerda latino-americana, ela mesma muito similar ao fascismo em diversos aspectos, adora acusar os adversários ideológicos de fascistas. Mas isso não faz o menor sentido.
Mussolini, que foi socialista em sua juventude, tinha pontos de vista que fariam vários esquerdistas “modernos” vibrarem de emoção. Por outro lado, como mostrei em meu último artigo no GLOBO, Marx e Engels eram imperialistas arianos e racistas, o que seria suficiente para que qualquer marxista, tivesse lido Marx ou gozasse de honestidade intelectual, acusasse o próprio mentor e guru de fascista.
Hoje, um artigo publicado no GLOBO, de Christian Caryl, faz um resumo razoável do que é o fascismo, expondo justamente o abuso que fazem do termo de maneira indevida. Seguem alguns trechos:
“Tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado.” A frase é de Benito Mussolini, uma das primeiras pessoas a falar com aprovação de “totalitarismo”. Fascistas acreditam no Estado porque o veem como a manifestação lógica da vontade de uma nação de afirmar e defender seus direitos coletivos. Assim, sindicatos, clubes e a imprensa deveriam ser subordinados ao governo.
[…] Foi o fascismo que nos deu a noção de um líder todo-poderoso, carismático — o Duce ou o Führer — que pessoalmente encarna os anseios da nação. (O comunismo também tinha seu Grande Timoneiro e seus Jardineiros da Felicidade, mas mesmo esses personagens sobre-humanos ainda estavam supostamente seguindo os ensinamentos de um certo filósofo judeu alemão.) Muitos autocratas pós-1945 — vem à mente o argentino Juan Perón — aprenderam com esses modelos.
É digno de nota que os movimentos de protesto na Ucrânia ou na Venezuela não lutam para instalar um líder em particular. Eles querem democracia — o oposto do poder de um só homem.
[…] Os fascistas celebram as massas — mas apenas quando elas são rigidamente organizadas em torno das necessidades do Estado.
[…] Os fascistas sempre veem a nação como ameaçada e sua tomada do poder é retratada como um renascimento nacional que varrerá a decadência e a fraqueza.
[…] Hitler e Mussolini viam suas versões do “nacional-socialismo” como a única alternativa válida a todas as outras ideologias políticas. Rejeitavam violentamente o socialismo e o “capitalismo burguês”, enquanto diziam se apropriar das melhores características de cada um.
[…] É verdade que alguns fascistas tentavam incorporar a Igreja Católica em seu sistema ideológico. Mas Hitler, um zeloso anticlerical, sonhava com o dia em que as massas pendurariam o Papa pelos calcanhares na Praça de São Pedro.”
Com isso em mente, fica mais claro que, no fundo, são os críticos da esquerda radical, que odeiam os liberais e conservadores, quem mais se assemelha ao fascismo. São nacionalistas, autoritários, enxergam o estado como entidade quase divina, adoram o culto à personalidade de um líder caudilhesco e populista, e gostariam muito de ver todos os padres da Igreja “ultrapassada” pendurados em praça pública.
Quem é fascista: Maduro ou o ex-presidente chileno, Sebastián Piñera, um empresário liberal? Pois é. Recomendo, para fechar, o excelente livro de Jonah Goldberg, Fascismo de Esquerda, para não deixar mais dúvida de como, apesar de toda a retórica contrária, parte da esquerda, a ala radical, possui extrema afinidade com os ideais fascistas.
Rodrigo Constantino
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