1. “No plano racional, a reclusão cumpre dois objetivos. Tira o criminoso de circulação, impedindo-o de voltar a delinquir, e serve de exemplo para que outros não o imitem. O problema é que, na maioria dos casos, podemos obter o mesmo efeito sem recorrer à prisão. A dificuldade para mudar de paradigma é que a parte mais intuitiva de nossas mentes ainda não se livrou da noção meio sádica de que quem comete um delito merece sofrimento como retribuição.” – Hélio Schwartsman
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/140065-martir-ou-bandido.shtml
2. “Quem vai visitar Dirceu e seus companheiros tem a impressão de que está num quartel. A sala de visitas é modesta, com mesa e cadeiras, e todos vestem roupas brancas. (…) Até esta quinta-feira, era Dirceu – hipocondríaco de carteirinha – quem cuidava do horário dos remédios de Genoino, conferia se ele se alimentava direito e procurava animá-lo.”
3.1. “Barbosa atendeu a um pedido da defesa de Genoino. Ontem, segundo seu advogado, Luiz Fernando Pacheco, ele passou mal e teve um princípio de infarto na penitenciária.”
3.2. “Após realização dos exames laboratoriais e de imagem, foi descartado infarto agudo do miocárdio e diagnosticado elevação dos níveis pressóricos (pressão arterial)” – Boletim médico do Instituto de Cardiologia do Distrito Federal (ICDF)
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Por mais que dê tratos à bola, não consigo imaginar a quais fantásticos métodos Schwartsman poderia estar se referindo ao afirmar que, sem que mantenhamos os criminosos atrás das grades, obteremos o efeito de tirá-los de circulação, impedindo-os de voltar a delinqüir e a oportunidade de fazer deles um exemplo para que outros não o imitem. Em todo caso, já estamos cansados de saber, intuitivamente ou não, que tudo o que acontece neste nosso (?) País é fantástico. E, apesar de que a questão da delinqüência seja um problema muito sério, não é bem isso o que nos deve preocupar agora.
O que agora nos deve preocupar é definir se um “homem de princípios” será ou não será capaz de cometer delitos. E se seria justo conduzi-lo à cadeia pública e pretender mantê-lo preso.
E não é que a parte mais intuitiva de nossas mentes não se tenha livrado da noção meio sádica de que quem comete um delito merece sofrimento como retribuição. Aliás, aquela turma dos Direitos Humanos, com a qual não consigo me dar muito bem, reunirá os maiores craques em apontar intuitivamente os que merecem sofrimento, tenham ou não tenham cometido delitos. É que, por não ser muito intuitiva, após a Imprensa nos ter dado conhecimento de que Genoíno teve (ou alegou ter tido) um “princípio de infarto”, aquelas questões passaram a me preocupar. E deveriam preocupar todo mundo.
Porque um infarto é um infarto – qualquer um de nós terá, ou não, um infarto; e o que for um “princípio” de infarto não será um infarto. Se Genoíno teve um “princípio” de infarto e não teve um infarto, o que sobrará para que ele tenha tido é um… “princípio”. Nada mais. Sendo aceito que Genoíno manifestou um “princípio”, nada impedirá que Genoíno seja reconhecido como um “homem de princípios”. Que “princípios” sejam esses exatamente, poderemos não estar sabendo. Mas não deixarão de ser “princípios”.
Resolvida a questão dos “princípios”, resta a questão dos homens. E mais outra coisa me preocupará. Se Genoíno voltar à cadeia, mesmo que aposentado por invalidez de acordo com os “princípios” que regem a Câmara dos Deputados, o que me preocupará é que ele possa ser posto na mesma cela em que estiver José Dirceu.
Porque temos notícia (pela qual poderemos ainda saber que um Quartel se caracterizará por manter uma sala de visitas modesta, com mesa e cadeiras e porque, nele, todos vestem roupas brancas – o que muito me informou, mas não me preocupou) de que José Dirceu é um hipocondríaco de carteirinha. E de que era Dirceu quem cuidava de Genoíno antes que este tivesse tido o “princípio” de infarto. Hipocondríacos tomam e recomendam aos amigos que tomem remédios como se chupassem caramelos. O que nos indica que alguém deverá ficar de olho em que Genoíno obedeça às prescrições médicas e tome os medicamentos da forma estritamente recomendada. Porque, se Genoíno não os tomar, se tomá-los de forma errada ou se tomá-los em excesso, estará apto a, outra vez, ser acometido por “princípios”. Ou alegar ter sido.
Poderá inclusive morrer. E, se Genoíno estiver na cadeia e, amanhã ou depois, Genoíno morrer (risco ao qual todos nós estamos expostos, na cadeia ou fora dela, tenhamos ou não tenhamos “princípios”), estará consagrado mais um mártir-guerreiro-do-povo-brasileiro, que brilhará nos altares de nossas igrejinhas políticas e na coleção de imagens de ilustres martirizados que mantemos em nossas estantes. Haverá romarias, ladainhas, quermesses, venda de santinhos…
Isso, evidentemente, por razões óbvias, nada intuitivas, deveria nos preocupar. E muito. Portanto me preocupa.
Sim, tudo isso teve um “princípio”. Teve, sim. O problema é que não vai ter fim… Nunca há de ter um fim. Haja paciência… Ó vida, ó céus…
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