PASSAPORTE PARA O INFERNO (*)

 

 

nunca pensei que viveria para ver tal despersonalização de minha Pátria: inicialmente, a Bandeira Nacional – que é única! – posta em paralelo com outra, de uma associação de poucos países, de discutível representatividade internacional e futuro aparentemente pouco promissor, à qual supostamente não teriam acesso Estados não democráticos (???); e a seguir, a substituição das Armas Nacionais, no documento que nos identifica perante o mundo, pelo mesmo símbolo internacionalista… –  Gil Cordeiro Dias Ferreira

 

***

 

     Desculpem-me o mau jeito, mas aqui vou (me) repetir: fatos de gravidade semelhante à dessa palhaçada que na epígrafe se denuncia e a que assistimos perplexos – e que em mera palhaçada não se resumem, pois se consubstanciam em uma descomunal agressão que nos é dirigida, à qual nos submetemos mansamente – não só hão de continuar se produzindo e reproduzindo como muito hão de se agravar. Porque são o resultado “normal” do desenvolvimento de um processo desencadeado por uma palhaçada fundamental, apenas permitida em virtude de uma grosseira, generalizada e absoluta falta de noção do que seja o Estado. E nos agredirão impunemente pelo menos enquanto o criminoso § único do art. 4º (“A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações“) não for arrancado, rasgado, pisoteado, queimado, enterrado, extirpado definitivamente daquela coisa imensa e maluca que vem acumulando remendos há quase 30 anos, a dita “cidadã” – uma tijolada na testa que desnorteou por completo os que já vinham, de praxe, agindo de forma absolutamente desnorteada, e que alguns conhecem pelo nome de “Constituição da República Federativa do Brasil”.

 

     Tentemos compreender: que é a República Federativa do Brasil? Não, não será qualquer “alternativa” ao Estado brasileiro que se possa colocar acima, abaixo ou ao lado dele. A República Federativa do Brasil é o Estado brasileiro, é o enunciado da forma como, em tese, o Estado brasileiro se organiza. A Constituição da República Federativa do Brasil será, portanto, a Constituição do Estado brasileiro – a nossa Constituição, a do nosso Estado, o brasileiro. Que nos indica como se dará essa nossa organização. E um Estado nacional não é um clube recreativo, uma sociedade anônima ou de responsabilidade limitada ou em conta de participação, não é qualquer ONG, um Governo, um Partido, uma Província, um fragmento de uma organização política qualquer. Um Estado nacional, seja ou não seja federal, há de autorizar-se – soberanamente! – a defender-se pretendendo, por si mesmo, manter-se – soberanamente! – em seus fundamentos.

 

     Tentemos compreender um pouco mais, porque as palavras não somente têm significado – elas têm conteúdo, elas dizem e produzem efeitos. Bons efeitos quando são bem ditas, péssimos efeitos quando são mal ditas. O princípio de qualquer coisa é o que permite seu surgimento, seu funcionamento, sua sustentação e sua articulação com as demais coisas do universo. Se qualquer coisa for concebida para que obedeça a dois ou mais princípios, ela não se acrescentará em virtudes – ela apenas há de se emperrar, não funcionará. Princípio é princípio. O princípio do Estado é um único – o poder soberano. Não requer ser enunciado. E que nenhum outro “princípio” se lhe invente para justificar-se seja o que for. Um Estado ou é um Estado ou não é – não o sendo, será uma província, uma colônia, um protetorado, qualquer coisa. Sendo um Estado, ninguém discutirá sua soberania ou sua independência. Porque são condição de sua existência enquanto tal. E, sendo condição, não serão um fundamento muito menos serão um objetivo. Qualquer outro enunciado que lhe seja atribuído como “princípio” em sua constituição não será “princípio” algum – será uma disposição que houve por bem ser enunciada como imperativa, o que nada mais significa que uma prerrogativa soberana. Assim como o princípio do Estado nacional não se poderá confundir com seus objetivos ou com seus fundamentos, nenhum objetivo do Estado nacional poderá pretender subordinar ou desvirtuar qualquer um de seus fundamentos e, muito menos, o seu princípio. Ao erguer-se um Estado nacional criado pelo poder soberano sobre fundamentos (= alicerces) democráticos, esse poder soberano não terá desaparecido – ele foi assumido pela Nação que o estenderá, democraticamente, ao conjunto da população dita nacional, aos cidadãos do Estado nacional.

 

     E um Estado não nos terá chegado às mãos a troco de nada. A um Estado nacional não cabe apenas exigir de suas instituições que o defendam com muito empenho e muita habilidade da seca, das enxurradas, das infestações de insetos e parasitas, dos ventanistas de plantão que o possam desolar – cabe a ele mesmo defender-se prioritariamente dos inimigos reais ou potenciais de sua sobrevivência e sua permanência – soberana! – enquanto Estado nacional entre seus pares. Principalmente, há de saber a que veio e a que está, consciente de que sem o exercício de um poder soberano (o da Nação que o criou) não viria à luz, de que, para que viesse à luz, exigiu sacrifícios, consumiu inteligência, dependeu de vidas nas quais seus sucessivos responsáveis se espelham e que merecem ser, por ele mesmo, exaltadas e eternizadas, e de que sem assumir o seu poder soberano, o que lhe foi transferido pela Nação que o criou, não se manterá.

 

     Já o fundamento de um Estado republicano que se caracteriza por ser uma democracia representativa enuncia-se claramente com as inequívocas palavras: “todo poder emana do povo e em seu nome é exercido” ou “será exercido”, tanto faz, palavras que são mais que suficientes. Pois, no “Título I”, que diz “Dos Princípios Fundamentais” que nos devem reger, do tijolo mal cozido que nos foi arremessado em 1988, uns caras-de-pau auto-intitulados “democratas” e alcunhados de “constituintes” enunciaram prolixa, redundante e confusamente como “fundamentos” do Estado brasileiro tudo isso aqui: “I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político”, acrescentando ao final dessa lista que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente” – atenção seja dada pelos incautos a esse “diretamente” – “nos termos desta Constituição”. E aquele § único do art. 4º, perfeito e acabado, vê-se cometido dolosamente entre os “objetivos” do Estado brasileiro, colocando-se em pé de igualdade com a “independência nacional”!

 

     Onde estamos? Que é isso? É um jogo de palavras? A que se deve? Às exigências da métrica e da rima? É poesia para ser recitada em tertúlia que reúna alegres bacharéis? Não, não é poesia. Essa agressão vil, escancarada e descaradamente lesa-pátria, contida em um parágrafo absolutamente incompatível com a preservação da integridade do Estado brasileiro, infectou suas entranhas como um vírus letal ardiloso que o tivesse cerceado e penetrado sem encontrar resistência, e se traduz como o preâmbulo de uma outra constituição – a de uma organização política pretensamente “superior” à nossa soberana representação. Não, não é poesia. É uma patada adicional em nossa cara sem-vergonha. Ou, melhor, é um coice que nos permitimos levar em seguida de uma queda.

 

     Se tivesse sido sugestão de um único Partido, se apenas alguns dos segmentos da “sociedade civil” o tivessem estupidamente aplaudido, talvez tivéssemos tido a chance de interromper o processo infeccioso que esse coice provocou e a de curar suas seqüelas. Mas a questão não se resume a isso: tanto esse coice quanto aqueles de quem o levamos contarão, para defendê-los, com a maioria dos integrantes da Sociedade nacional que, por ignorância ou má fé, ainda alardeia as “virtudes democráticas” do golpe branco de que fomos vítimas em 1988; e, pior, contarão com as Armas nacionais – e aqui não me refiro ao nosso Brasão, símbolo da honra, da nobreza e da glória brasileiras, que antes se estampava em nossos passaportes, mas às Armas em sua materialidade, às Forças Armadas do nosso Estado. Porque as que nossas Armas são, que teriam o compromisso de defender o nosso Estado – que somos nós em nossa organização política, a que nós mesmos definimos e que, quando erramos, deveríamos tratar de consertar –, assumem o compromisso de defender os “poderes constitucionais”.

 

     Que ninguém se iluda, pois, com a redação do Art. 142 (Seção III – DISPOSIÇÕES GERAIS – CAPÍTULO II – DAS FORÇAS ARMADAS) “As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. O contido nesse artigo apenas nos diz que elas defenderão aquele maldito parágrafo porque ele é uma disposição constitucional – apesar de que, a bem dizer, seja expressamente uma autoritária… “disposição transitória”… (“a República Federativa do Brasil buscará!”), provisoriamente válida até que se consolide a estapafúrdia organização comunitária supranacional que nos vem sendo imposta, aos trancos dados, com a força da lei, pelas patas voluntariosas de meia dúzia de animais irracionais. Elas, as nossas Armas, assumem, pois, o compromisso de defendê-lo e o defenderão com unhas e dentes.

 

     Mas não assumem o compromisso de ler essa Constituição. Assumem? Penso que não. Porque se o assumissem e se a lessem… questionariam esse arremedo de Carta Magna que promove a substituição de um Estado nacional por um arremedo de Estado que, nela e por meio dela, predestina-se à extinção e, em si mesma, justifica esse processo de extinção; e não defenderiam essa palhaçada toda que só um desaforo é, e causa efeitos perversos na Política nacional, interna e externa. Portanto, presume-se que não a leiam, nem leram as Constituições que a antecederam, para que pudessem, assim, compará-las. Apesar de que reze a lenda que o Mal. Dutra, que poderia lhes servir de exemplo, mantivesse, à sua época, “o livrinho” sempre à mão, “para não errar”.

 

     Pensando bem, para que nossas Armas, a instituição nacional representada por nossa gente fardada, sentir-se-iam estimuladas à leitura da Constituição, se não lhes compete alterá-la (isso compete apenas aos mesmos remendões oficiais que por ela são responsáveis, os que elegemos e reelegemos há décadas…). Não, isso não lhes servirá de desculpa ou pretexto, mas talvez seja por isso que não a leiam, e, porque não a lêem, não se permitem discuti-la – apenas a defendem. Com unhas e dentes. Porque é de sua função defendê-la e porque assumem essa defesa como missão. Burocratizadas em grau absurdo, “corretamente” despolitizadas, porque assim a hierarquia e a disciplina agora determinam que sejam, defendem-na, por certo, “em confiança”.

 

     Em quem, exatamente, as FFAA vêm confiando não se sabe bem ao certo, nem se sabe, tampouco, de quem ou de que possam pretender se precaver. Imagino que a confiança não se dará a algum “patriotismo” insuspeitado que a celebrada “Nova República” nos tivesse imposto (estaria tão camuflado que dir-se-ia inexistente?). Nem seria dada ao revolucionário e exacerbado “patriotismo” de um Jaques Wagner, tão bem explicitado em 31 de maio último na sua página do Facebook (**), quando nos diz, do alto de seu cargo e de sua função de Estado, que “os petistas”, não todos nós, os brasileiros, deverão ter orgulho do que são porque não são “cidadãos de 2ª classe”. Nem, por certo, ao “patriotismo” que nos puderam demonstrar seus antecessores no tal Ministério da Defesa… (da defesa de que, mesmo?).

 

    É fácil, rápido e rasteiro deduzir, portanto, que, se as Armas nacionais, as nossas Armas, sob infeliz regência constante nos últimos tempos, vêm defendendo e para sempre defenderão, sem que se apercebam dela, essa palhaçada toda que se constituiu à nossa revelia e contando, se não com nossa conivência, com nosso absoluto descaso, já nada nos diz que elas se predisporão a continuar defendendo o nosso Estado. O que significa, por sua vez, que já nada nos diz que nos defenderão enquanto Nação. Por quê? Porque estúpidas elas não são, embora já tenham perdido – ou, pelo menos, o grosso da Oficialidade já perdeu – a noção do que tudo isso pudesse, na realidade, significar. E por que mais? Porque oligofrênicas elas também não são, nem saem por aí a morder a própria orelha, e comprometer-se ao mesmo tempo com a defesa de modelos, teorias e práticas que a nossa Escola em todos os níveis, as militares inclusive, colocam como correspondentes a estímulos político-filosóficos tão visceralmente antagônicos quanto o Bem e o Mal seria apenas a demonstração de uma inadmissível incoerência e a admissão de uma cabal inconsistência ideológica, em estrito e amplo sentidos. Seria algo absurdamente ilógico que não será lícito lhes atribuir, em nenhuma hipótese.

 

     Haverá de lhes bastar, então, defender a Constituição que não lêem, da qual, portanto, não duvidam porque estão seguras de que dela duvidar não lhes compete. Defenderão a Constituição na qual vêm depositando sua confiança. E, assim, a lei, a ordem, o Ministro, o Governo, a “paz” (?), a democracia”, o “povo” (?), sim, até mesmo um território, elas saberão, poderão e hão de querer defender. E têm poder, têm conhecimento e têm alguns elementos materiais para tanto. Mas, defender os corretos fundamentos de nosso Estado, já não. A integridade da Nação brasileira, já também não. Muito menos o valor de nossa História. No que coincidem com a Sociedade brasileira. E com o que o nosso Brasão – símbolo da honra, da nobreza e da glória brasileiras – perde o sentido, e não haverá por que a identidade brasileira manter-se a ele vinculado.

 

    Pensemos mais um pouco: se acatarmos como apropriadas e lúcidas as palavras do Ministro da Defesa (que, de seu cargo e função de Estado, prega o “orgulho de ser petista”), de que e de quem os brasileiros deveríamos nos envergonhar? Dos que petistas não são, evidentemente, dos que escolheram o Partido errado. E isso deve incomodar a Sociedade, pois nem toda ela é petista. Mas, seja qual for o Partido no Poder, seja quem for o Ministro da Defesa, seja quem for que se diga na Oposição, se concordarmos com o acerto de “nossa” Carta Magna, de quem e de que tanto a Sociedade quanto as nossas Armas republicanas deverão se precaver e defender o território, as Instituições, a História, algum projeto para o futuro? O resultado dessa charada será inequívoco: de nós, empedernidos e reacionários nacionalistas (pchiiiuu, nunca digam essa palavra, vergonhosa em si e por si mesma, um palavrão! “Nacionalismo”, todos estão sabendo, é o mesmo que “fascismo”, algo que comunistas e liberais desde sempre combateram e hão de combater! Não é mesmo?). Todos os que desejam manter algo de que se orgulhar deverão defender o que é seu e se precaver de nossas ameaças, as da Nação brasileira, de nós mesmos. Apenas de nós, de ninguém mais. Nós somos “o inimigo” potencial desta dita República, nós, a Nação brasileira, um inimigo que, se usasse de inteligência, se tivesse decência e se projetasse o vulto que deveria projetar, se agisse como se soubesse quem realmente é e honrasse seu passado, se soubesse como se colocar e como exigir respeito de si mesmo e de todos os demais, ao se recusar a ser identificado politicamente por pertencente a “uma entidade puramente comercial e aduaneira” – que é como o Mercosul se define, tal como Gil Ferreira nos relembra em seu texto (***) –, ou seja, ao se recusar a comportar-se como mera mercadoria exibindo no rótulo um certificado de origem que lhe justifique um preço aleatório, poderia muito ameaçar os Governos que “democraticamente” vêm sendo eleitos, a “paz fraterna e solidária” celebrada com nossos vizinhos, os amplos direitos sociais e individuais já reconhecidos, a plena liberdade e a igualdade como valores supremos de uma sociedade “sem preconceitos” fundada na harmonia social e comprometida com a solução pacífica das controvérsias… um inimigo que poderia ameaçar seriamente a “integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade” supostamente una, próspera e justa por sua própria natureza… recusando-se a subordinar a estranhos o destino de seu próprio Estado, aquele pelo qual é responsável, e, portanto, o de sua própria vida.

 

     Nós somos “o inimigo” potencial do que se esboça em “nossa” Constituição e vem sendo alinhavado para que seja bem costurado, ninguém mais – por isso mesmo é preciso que sejamos combatidos, é preciso que sejamos podados em nossas expectativas, e é preciso que nos recolhamos à nossa atribuída insignificância, a insignificância a que devem recolher-se os verdadeiros “cidadãos de 2ª classe”, aqueles que, um dia, tendo sido cidadãos do Estado brasileiro, não encontram por que aceitar, ainda que seja algo muito “importante para redução das desigualdades regionais“, qualquer compromisso que represente apenas a oportunidade de dar um calote de US$ 120 milhões que não temos sobrando no quintal e que pudessem estar sendo utilizados para que superássemos as nossas reais dificuldades e tentássemos reduzir as de fato nossas desigualdades, as nacionais (****).

 

     Mas, na realidade – e que isso não nos sirva de consolo -, bem antes que inimigos de alguém mais, seremos o único inimigo real de nós mesmos. Porque, ao estender nossas prerrogativas nacionais, por nossa própria generosidade, a uma Sociedade nacional plural altamente complexa mantendo-nos na absoluta ignorância das questões, das razões e dos processos políticos como se estivéssemos em estado de graça e desejássemos apenas perpetuá-lo, permitimos que em nós mesmos fosse gerado e se desenvolvesse o embrião do inimigo de nós mesmos. E, voluntária, irresponsável e orgulhosamente prenhes dele, não mais sabemos como, nem mais teremos meios de combatê-lo. Nem encontramos por que dele nos livrar.

 

      Repito aqui o que venho dizendo há muitos e muitos anos – ao público em geral, há 10 redondos anos, no barato (em rápida busca em meus arquivos, encontro o texto que transcrevo abaixo, por exemplo – “Por nossa virtuosa intolerância” –, ainda mais ou menos cauteloso e mais bem comportado que este, que foi publicado na Tribuna da Imprensa-RJ em 20/05/2005); na Academia e aos mais próximos, venho dizendo, com plena certeza, há muito mais tempo. Se nem com nossas Armas poderemos mais contar para nossa defesa, porque não só elas se deixaram atar como nós mesmos permitimos que fossem atadas, com quem contaríamos para tanto? Repito mais uma vez, numa dessas já por mero cacoete mental. Repito à toa, pois ninguém admite levar a sério essa questão que tenho a irritante mania de dizer que nos é vital.  Nenhum “representante do povo brasileiro” se dispõe a levantá-la no Congresso, talvez porque, se for minimamente lúcido para compreender a premente necessidade de fazê-lo, bem saberá que ninguém lhe dará ouvidos. Mesmo porque o “povo brasileiro” (?) bem ou mal representado no Congresso nem idéia tem do que, enquanto povo, ele mesmo seja; e muito menos terá qualquer idéia do que seja a Política, do que seja o Brasil ou do que uns e outros vêm fazendo com “nosso” país (de quem, mesmo, ele é?). E por aí vão as coisas, sempre cada vez mais em frente.

 

     E, afinal, se algum significado ele adquiriu para nós, brasileiros, o Mercosul – nome fantasia que camufla um projeto eminentemente político, ao qual faltará um hífen ou faltará um S, caso contrário deverá ser lido Mercozul pelos que bem sabem ler o que está escrito – deve estar servindo para alguma coisa. Caso contrário, já teríamos tomado a providência de denunciar o Tratado esperto que o criou. Ou nossa Diplomacia já não tem discernimento e não é capaz de saber o que deve fazer? Qual seria esse seu significado? Não importa, ele será… significante! Mas, a que é, mesmo, que vem servindo, na prática, o Mercosul? Às nossas “pequenas” causas: a preservação e o bom uso de nossos recursos, nossa indústria, nosso comércio, nosso agronegócio, nosso desenvolvimento, portanto, a saúde, a educação, o bem estar de nosso povo? Ou estaria servindo exclusivamente à barafunda conceitual infernal que promove seu único objetivo, a integração regional, para que enfrentemos com maior poder, um poder potencializado pelo poder de nossos vizinhos (?), o cruel mundo hierarquicamente globalizado? E, por isso mesmo, ele se justificará?

 

     E assim vamos compreendendo que uma política de integração é coisa santa, sagrada, inquestionável, coisa fina, sofisticada, atualíssima, desenho europeu, de projeção universal… – olhem só o sucesso que vem fazendo no Velho Mundo, resolvendo todos os problemas seculares de todos os povos daquela região geográfica! Não? A integração nacional não vale tanto ou vale nada. Será coisa típica de caipira. Mas a internacional, ah, esta é coisa pela qual só os nossos santos guerreiros e aqueles que possuem uma capacidade intelectual privilegiada, os iluminados, seriam e são capazes de se predispor a lutar! Com unhas e dentes.

 

     Aos entusiastas do Mercosul, que agora nos carimba, qualifica, identifica e substitui provisoriamente, com sua generosa e sólida estrutura, essa nossa Pátria tão pequena e insignificante enquanto a desejada “Pátria Grande” não se converte plenamente em definitiva, aos entusiastas do que o antecedeu e do que o sucederá, ofereçamos, pois, a nossa outra face. Em seguida, novamente a primeira, e mais uma vez a outra, e mais outra vez a primeira, e ainda uma vez mais a outra… Se é que, algum dia, algum bofetão que tivéssemos levado chegou a nos causar alguma dor, hoje, uma vez que nosso corpo e nossa inteligência já foram, por inteiro, absolutamente anestesiados, já nenhum mais nos dói. E, se não acreditamos piamente em blefes estúpidos como o de que o joão-bobo deve ser considerado um modelo de “cidadania”, reagir como reage esse brinquedinho nos distrai, nos ocupa o tempo vago e até mesmo nos diverte um bocado. Porque é divertido. Saudemos agora, pois, a logomarca, a bandeira, o passaporte e os partícipes do Mercosul, esses nossos “irmãos” tão injustamente (ainda, por enquanto…) “inexplicavelmente” até hoje menos afortunados que nós… – e, muito em breve, haveremos de estar saudando a moeda única. Saudemos o ingresso do Suriname e da Guiana como membros associados desse poderoso bloco. Saudemos tudo isso com o coração aberto, com alegria, com entusiasmo, tal como já saudamos a porosidade de nossas fronteiras e a abdicação à nossa suposta hegemonia e à nossa efetiva soberania, tal como devemos saudar o fogo, a mandioca e a bola de folhas de bananeira. Como fatores da evolução que nos transformou, daquilo muito feio e vergonhoso que um dia, no passado, nós já fomos, em homens e mulheres sapiens, orgulhosos e sapientíssimos… Está bom assim? Deve estar.

 

     Pois, então, estamos combinados! E ninguém fala mais nisso. Falar nisso para quê? Se há tantos assuntos tão mais amenos que nos ajudam a elevar nosso espírito de tendência tão pré-jurássica, tão belicosa, tão mesquinha, tão injusta e nos amparam a alma tranqüila, coberta de bênçãos que nos asseguram a eterna bem-aventurança…

 

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(*) Título da obra de Célhia de Lavarène que retrata as condições impostas aos jovens que para a Libéria imigravam atraídos por falsas oportunidades de viver em paz e em liberdade, e viam-se submetidos a um regime de escravidão nos bordéis, com a conivência de membros da administração pública, homens de negócios, soldados das forças de paz e demais setores da ONU, entidade que não fornecia meios capazes de proporcionar qualquer segurança às vítimas deste processo criminoso.

(**) “Tenho visto com muita preocupação manifestações recentes de ódio e intolerância contra simpatizantes e representantes do PT. Em aeroportos, hospitais e restaurantes, brasileiros que não concordam com nossas ideias e nosso projeto estão se sentindo à vontade para nos agredir e nos humilhar. Não podemos aceitar isso. Temos que reagir, mas não usando as armas deles. Vamos rebater provocações com argumentos e números, mostrando a eles que nenhum outro partido fez tanto pelo Brasil quanto o PT. Nosso partido nasceu nas ruas e formou a sua identidade a partir das lutas, dos sonhos e da esperança do povo brasileiro. Sob o comando de Lula e Dilma, levamos educação, saúde e dignidade para milhões e milhões de pessoas que ao longo de nossa história foram tratados como cidadãos de segunda classe. Por isso, jamais devemos nos envergonhar do que somos. De cabeça erguida, peito estufado e sonhos renovados, temos que continuar lutando para derrotar o conservadorismo e tornar o Brasil um país cada vez mais justo. Precisamos, sobretudo, ter orgulho de ser petista!” Jaques Wagner

https://www.facebook.com/jaqueswagneroficial/photos/a.507396309298464.1073741827.136224023082363/890597667644991/

(***) Ao início de 2010, entre perplexo e indignado, constatei termos passado a ser obrigados a hastear, ao lado da Bandeira Nacional – símbolo maior da Pátria – o pavilhão de uma entidade puramente comercial e aduaneira – o Mercosul – que não tem, para nós, brasileiros, um infinitésimo do significado de nosso lábaro estrelado, de nossa flâmula verde-louro.

A esdrúxula Lei Ordinária que criou tal absurdo – nº 12.157, de 23/12/2009, de iniciativa de um deputado petista – limitou-se a alterar o Art. 13 da Lei 5700 de 01/09/1971 (dispõe sobre os Símbolos Nacionais), que passou a ter a seguinte redação:

Art. 13.  Hasteia-se diariamente a Bandeira Nacional e a do Mercosul:

……………………………………………………………………………………………….

A palavra “Mercosul” não foi incluída em qualquer outro trecho da Lei 5.700. Ou seja, não se definiram “Mercosul” nem “Bandeira do Mercosul”, mas, do nada, impôs-se seu hasteamento ao lado da Nacional, o que vale a alçar tal galhardete a Símbolo Nacional, como o Hino, as Armas e o Selo!

Não bastasse tal heresia, eis que agora, na contramão do que ocorre na maioria dos países do mundo, suprimem-se do Passaporte as Armas Nacionais, substituídas pela logomarca do mesmo Mercosul.

Educado em escola pública, no alvorecer dos anos 50, quando o civismo era efetivamente cultuado no Brasil, nunca pensei que viveria para ver tal despersonalização de minha Pátria: inicialmente, a Bandeira Nacional – que é única! – posta em paralelo com outra, de uma associação de poucos países, de discutível representatividade internacional e futuro aparentemente pouco promissor, à qual supostamente não teriam acesso Estados não democráticos (???); e a seguir, a substituição das Armas Nacionais, no documento que nos identifica perante o mundo, pelo mesmo símbolo internacionalista, em flagrante descumprimento à Lei 5.700, sujeito a penalidades:

CAPÍTULO III – Da Apresentação dos Símbolos Nacionais / SEÇÃO III – Das Armas Nacionais

Art. 26. É obrigatório o uso das Armas Nacionais:

……………………………………………………………………………………………………………………………

X – Nos papéis de expediente, nos convites e nas publicações oficiais de nível federal.

CAPÍTULO VI – Das Penalidades

Art. 35 – A violação de qualquer disposição desta Lei, excluídos os casos previstos no art. 44 do Decreto-lei nº 898, de 29 de setembro de 1969, é considerada contravenção, sujeito o infrator à pena de multa de uma a quatro vezes o maior valor de referência vigente no País, elevada ao dobro nos casos de reincidência. (Redação dada pela Lei nº 6.913, de 1981).

Art. 36 – O processo das infrações a que alude o artigo anterior obedecerá ao rito previsto para as contravenções penais em geral. (Redação dada pela Lei nº 6.913, de 1981).

Jamais imaginei que viria a ser governado por indivíduos capazes de gesto tão desprovido de patriotismo, nem para me surpreender com a apatia da maior parte da população diante do feito. Teremos perdido a capacidade de nos indignar? Teremos esquecido as lições aprendidas e repetidas desde a infância, de que os Símbolos Nacionais devem pairar, altaneiros e únicos, acima de tudo e de todos que compõem a Nação brasileira?

Espero, ao menos, não viver o suficiente para constatar que essas absurdas mudanças sejam o prenúncio de outras piores: a substituição definitiva de nossas amadas Bandeira e Armas Nacionais por outras, provavelmente vermelhas, assemelhadas ao símbolo que o presidente   boliv(ar)iano ofertou ao Papa em julho/2015, representativas de uma possível URSAL – União das Repúblicas Socialistas da América Latina, a que o Mercosul em breve poderá dar lugar.

Mais se afigura tal possibilidade, à vista da criação, em 23/02/2010, pelos 33 presidentes de países da América Latina e Caribe, reunidos em Cancun, no México, à revelia da ONU e da OEA, de uma nova organização internacional de perfil esquerdista,  que inclui Cuba, restringe o ingresso de Honduras e deixa de fora Estados Unidos e Canadá: a Comunidade dos Países da América Latina e Caribe, que, ao que tudo indica, tentará implantar entre nós os sistemas marxistas-leninistas que o mundo civilizado lançou à lata de lixo da História junto com o Muro de Berlim, há 26 anos, em 09/11/1989, mas que Fidel, Lula e outros ressuscitaram oito meses depois, em julho de 1990, quando criaram o Foro de São Paulo – espécie de “V Internacional Comunista” centrada em nosso continente .

Diante de tal quadro, resta-me apenas evocar Castro Alves: Auriverde pendão de minha terra, / Que a brisa do Brasil beija e balança, / Estandarte que a luz do sol encerra, / E as promessas divinas da esperança…/ Tu, que da liberdade após a guerra, / Foste hasteado dos heróis na lança, / Antes te houvessem roto na batalha, que servires a um povo de mortalha!… (…) Mas é infâmia demais ! Da etérea plaga, / Levantai-vos, heróis do Novo Mundo! / Andrada, arranca esse pendão dos ares ! / Colombo, fecha a porta dos teus mares !

Gil Cordeiro Dias Ferreira – Administrador – CRA/RJ 20-42893-6 – gil.ferreira@globo.com

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(****) http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-da-calote-em-fundo-do-mercosul–imp-,1726070

Brasil dá calote em fundo do Mercosul

Lisandra Paraguassu – O Estado de S.Paulo – 16 Julho 2015 | 02h 01

Brasil deve cerca de US$ 120 milhões e vai abrir a cúpula do bloco, que se inicia amanhã, sem poder definir quando vai zerar a conta

BRASÍLIA – Prestes a estender o prazo de funcionamento do Fundo para Convergência Estrutural do Mercosul (Focem), usado para financiar obras de infraestrutura entre os países da região, o governo brasileiro acumula uma dívida de nada menos que US$ 120 milhões com o fundo.

Os dados constam de um levantamento feito pelo Itamaraty a pedido do senador Heráclito Fortes (PSB-PI), sobre todas as dívidas do País com organismos internacionais.

O documento, obtido pelo Estado, aponta que entre os débitos está o Focem, que financia obras estruturais, especialmente no Paraguai e no Uruguai. Foi com recursos do fundo, por exemplo, que se construiu a linha de transmissão de energia entre a Usina de Itaipu e a capital paraguaia, Assunção, com um custo de US$ 550 milhões.

O fundo é formado por recursos dos cinco países-membros plenos do bloco. O Brasil deveria entrar todos os anos com US$ 70 milhões; a Argentina, com US$ 27 milhões, assim como a Venezuela. O Uruguai aporta US$ 2 milhões e o Paraguai, US$ 1 milhão. O Brasil, no entanto, acumula dívidas com o Focem ano após ano. Até 2014, já eram US$ 97,07 milhões. Neste ano, o País deixou de pagar outros US$ 24,5 milhões.

Amanhã, tem início em Brasília a Cúpula do Mercosul. A intenção é mostrar que os últimos seis meses tiraram o bloco da inércia dos últimos dois anos. A renovação do Focem é um dos pontos centrais da cúpula e o Brasil anunciará sua intenção de levar adiante a renovação do fundo. Essa renovação foi prometida pela presidente Dilma Rousseff ao assumir a presidência do bloco, em dezembro de 2014.

A boa notícia, especialmente para o Paraguai e para o Uruguai, maiores beneficiários do fundo, vem manchada pela dívida do Brasil, responsável por 70% dos recursos do Focem. Em reais, o saldo negativo chega a R$ 375 milhões.

Renovação. Procurado, o Ministério do Planejamento, que é o responsável pela liberação de recursos para pagamentos de fundos internacionais, informou que a renovação do Focem está sendo negociada com os parceiros do bloco e que “os recursos a serem aportados pelo Brasil são operacionalizados conforme a programação financeira do governo e a necessidade efetiva do Fundo”.

O Estado apurou que a negociação está sendo difícil dentro do governo brasileiro, apesar da decisão da presidente, que costuma citar o fundo como um dos pontos positivos do Mercosul. O Planejamento resistia a uma renovação imediata do compromisso em um ano de parcos recursos.

Consultado, o ministério disse que o Focem é “importante para redução das desigualdades regionais” e defendeu “a importância de se caminhar no sentido de tornar esse Fundo mais eficiente e efetivo”.

Acordos. Depois de dois anos em que o bloco se concentrou mais em crises do que resultados práticos – entre elas a suspensão do Paraguai e a conturbada entrada da Venezuela -, nos últimos seis meses, o Brasil, na presidência, tentou acelerar a implantação de acordos comerciais discutidos, mas nunca implementados.

Pressionado pela necessidade de apresentar resultados nessa área, o Brasil levou adiante as propostas de acelerar a redução de tarifas com os países da Aliança do Pacífico, A intenção é tentar acelerar a criação de uma zona de livre-comércio entre os países da Associação Latino-americana de Integração (Aladi) até o fim de 2016 – a previsão inicial era apenas 2019 -, incluindo o México.

Uma das vitórias cantadas pelos diplomatas brasileiros é o horizonte definido para uma troca de ofertas para o acordo com a União Europeia, o que deve acontecer até o fim deste ano. Além disso, o Itamaraty também vai apresentar aos demais países do bloco a proposta da Índia de ampliar um pequeno acordo comercial já existente, de apenas 470 produtos.

Na cúpula de amanhã, quem assumirá a presidência do bloco é o Paraguai, um dos maiores interessados em acelerar todos esses acordos. Na visão de negociadores brasileiros, isso traz uma boa perspectiva para que o trabalho iniciado pelo Brasil seja mantido e o bloco pare de “discutir a relação” e se volte para a implementação das questões práticas essenciais aos países-membros.

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POR NOSSA VIRTUOSA INTOLERÂNCIA

Vania Leal Cintra – Tribuna da Imprensa/RJ em 20-05-2005

O que estrutura e mantém o desenho da ordem mundial não é outra coisa senão as Políticas de Estado articuladas às políticas de Mercado.

Subordinada aos interesses de Mercado, a Política do Estado apenas reforça os lugares predefinidos pela ordem. Uma Política de Estado voltada, ao revés, ao fortalecimento do Estado Nacional e às necessidades de desenvolvimento e bem estar de sua população é, no entanto, o único instrumento de enfrentamento da ordem que nos é adversa.

Elegendo Governos sucessivos cuja propaganda alardeia pretender alterá-la em nosso benefício, voltamos a ser o “celeiro do mundo”, exportadores de alguns produtos industrializados mas dependentes da “otimização” das empresas multinacionais, moldando nossas capacidades competitivas de acordo com a espécie e o número de botões que, nelas, nos permitem acionar. Como pretender acudir a nação brasileira se são parcos os nossos recursos e se nossas prioridades serão o desenvolvimento do Caribe, a balança comercial argentina ou a internacionalização da Amazônia?

Em vez de reclamarmos contra buracos nas ruas ou goteiras nos cinemas, contra a “falta de liberdade cidadã” tal como sadios e corados catalães puderam gritar, um dia, por não poder ver os filmes pornográficos que se exibiam em Perpignan, ou contra a arrecadação federal, em vez de aplaudir plebiscitos a respeito de quem pode ou não ter armas, inclusive o Estado — problemas que se solucionam com meras Resoluções, e que muitas vezes nem problemas são, são apenas o resultado de má administração de recursos, e outras vezes são os únicos dispositivos capazes de manter, apesar de capenga, a integridade do Estado Nacional — deveríamos nos levantar todos e nos mobilizar todos, antes que tudo, contra o absurdo § único do Art. 4º de nossa Constituição, que define nosso presente e nosso futuro determinando que busquemos, como Objetivo Nacional, “a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina” e que asfixiemos nosso progresso e nossa ordem na “formação de uma comunidade latino-americana de nações”.

Nenhum Constituinte em 1988 se lembrou de propor plebiscito algum sobre a questão da integração de nosso País a outros países de origem, características e interesses diversos dos seus, questão que nos adjetiva e que substantivamente nos afeta, todos. Não seria hora de que ela fosse esclarecida em todos os seus grãos e, em seguida, decidida efetivamente pela Nação Brasileira?

Nenhum Congressista dispõe-se hoje a propor a discussão de uma Emenda que elimine, pelo menos e definitivamente, esse instrumento maldito que, utilizado, e utilizado vem sendo, representa apenas o nosso consensual suicídio coletivo, instrumento que alguns puderam construir à nossa revelia, ou melhor, por sobre a nossa ignorância em assuntos básicos relativos à Política, à Soberania e ao próprio Mercado — Mercado esse que não se organiza através da intenção e da ação de anjos imaculados. Acabemos com ele, assim como Geisel, um dia, pôde romper um Acordo Militar celebrado com os EUA — por ser nocivo aos nossos próprios interesses.

Enquanto não definirmos quem somos, não haverá qualquer perspectiva de Brasil à nossa frente. Nenhuma política cultural, nenhuma política nacional. E o Brasil quer um assento no Conselho de Segurança exatamente para quê?

De nada resolve, tampouco, gritar contra a corrupção (todos os Governos do mundo inteiro são corruptos — a diferença é que eles são representativos de algo-qualquer nacional e os nossos últimos perderam essa característica, que é pragmática, não é “ética”); de nada resolve espernear contra vencimentos militares aviltados (se a intenção do Estado é manter apenas tropas auxiliares, que ganham em dólares, e, por dez tostões, uma Guarda Pretoriana que garanta Governos contra nós eleitos por nós mesmos! E se muito em breve os vencimentos da Reserva serão, provavelmente, desvinculados dos da ativa); de nada adianta choramingar contra impostos federais (como o Brasil poderá financiar o desenvolvimento dos vizinhos sem nos sangrar? Aonde nos leva apostar em políticas fragmentadas, municipais, se o nacional nelas desaparece? Por outro lado, de onde vem o orçamento federal, que mantém funcionários federais — FFAA, Educação, Saúde, Segurança interna, os que nos garantem a administração federal e nosso próprio desenvolvimento?).

A nossa intolerância com todos e com tudo é hoje necessária. E é, cima de tudo, virtuosa. Não só a intolerância com “os outros”, mas com tudo aquilo que possamos estar fazendo, nós mesmos, contra nós. A intolerância absoluta com a inércia, com o marasmo, com a conivência com nossos adversários reais e/ou potenciais, que nos querem ver aos pedaços, passou a nos ser, simplesmente, vital.          

  

 

 

 

  

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